sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Conhecendo os Mestres: Go Nagai

Já faz tempo que queria fazer algo assim aqui no Mangás Cult, e então aparece aqui uma nova coluna, onde irei falar sobre alguns dos mangakás. Para começar a coluna em grande estilo, escolhi um cara que é facilmente um de meus mangakás favoritos, além de ser um dos caras mais importantes da história dos quadrinhos e da animação japonesa. Sempre marcando época com suas épicas histórias, sendo que muitas
delas causavam altas polêmicas para os conservadores da época. Um sujeito que não tinha medo de ousar e explorar terrenos desconhecidos. Ele, o cara que pode ser chamado de o "Quentin Tarantino Japonês", o inigualável Go Nagai!





Com seu nome de nascença Kyoshi Nagai. Ele nasceu em 1945, na cidade de Wajima, localizada na prefeitura de Ishikawa. Quando criança, algumas de suas maiores influências foram Gustavo Doré (em uma edição de "A Divina Comédia", o que provavelmente explica o uso de humor negro em muita de suas obras) e Osamu Tezuka (Me pergunto a quem dos mangakás da época ele não influenciou, Tezuka foi um mito).

Após se formar do Colégio Itabashi (que fica em Tokyo, para onde Nagai se mudou com a família após a morte do pai), Nagai entrou para o mundo dos quadrinhos. E chegou a passar um ano como Ronin (estudante que se forma do Ensino Médio mas ainda não entrou na faculdade). A saúde de Nagai não era das melhores na época, ele sofreu durante 3 semanas de um grave caso de diarréia. Ciente do seu estado de saúde, ele quis deixar evidências de que viveu, e para isso foi fazer algo que ele sempre quis desde criança: Trabalhar em mangás. Ele se determinou a criar um mangá dentro do tempo que ele pensava ser seus últimos meses de vida.

Após a decisão, Nagai foi ao hospital, onde foi diagnosticado com Colite, mas logo depois curado. Esse foi o divisor de águas na vida do jovem Nagai. Ele tinha se convencido de que trabalharia com mangás e parou de frequentar a escola e após 3 meses, passou a viver como Ronin.

Com a ajuda do irmão, ele fez os seus primeiros esboços. Apesar de sua mãe ser contrária à decisão, ele levou seus trabalhos. Rezam as lendas, que quando Nagai ia até uma editora, a mãe dele convencia os editores que rejeitassem os esboços dele (que mãe pentelha, viu?), mas então a Shogakukan (a casa de revistas como a Shounen Sunday e a Big Comic) entrou em contato com Shotaro Ishinomori (conhecido por ser o pai de "Kamen Rider", "Cyborg 009", "Jinzou Ningen Kikaider" e "Ryu no Michi") para avaliá-lo. E em 1965, graças aos esboços feitos com a ajuda do irmão, ele foi recebido por Ishinomori, que o recebeu como
seu discípulo e o ensinou tudo o que sabe (vale lembrar que Ishinomori passou pela mesma coisa, quando foi aluno de Osamu Tezuka) e dois anos depois, começou a sua carreira como Mangaká profissional.

No começo de sua carreira, Nagai fez um one-shot chamado Meakashi Polikichi, que foi publicado em 1967 na revista Bokura, da Kodansha.Nesta época, a Shueisha planejava fazer uma nova antologia de mangás (se vocês se ligaram na linha do tempo, sim, é da Shounen Jump que estou falando), e notou o trabalho de Nagai no oneshot publicado na Bokura, e então, um ano depois, na primeira edição da Jump, ao lado de alguns novatos e veteranos, Nagai decolava com o que seria a sua primeira série, e também um de seus maiores sucessos (Além de ser um dos mangás mais polêmicos da história), o Famoso "Harenchi Gakuen", que abalou as páginas da Jump na época!

Essa é a história de como Go Nagai se tornou mangaká, a seguir, falarei de algumas de suas séries mais importantes.

Harenchi Gakuen: Valores Morais? Isso não te pertence mais!

Harenchi Gakuen foi o primeiro sucesso de Nagai, além de ter sido um dos primeiros grandes sucessos da atual gigante Shounen Jump.  A História mostrava uma escola primária onde todos os professores e alunos são uns completos pervertidos. Meninos espiando as meninas se trocando, e as mesmas levantando suas saias para todos verem. E entre eles um garoto tentando proteger sua namorada, Juubei, desse bando de tarados. Certamente, a história faz completo jus ao título do mangá, e com isso, Nagai é conhecido por ter sido o pioneiro na introdução do erotismo aos mangás (Eu duvido muito que sairia algo assim na Jump hoje em dia, nem mesmo o nefasto To Love-ru chega perto). HG abriu as portas do sucesso para Nagai, mas como nem tudo é um mar de flores... surgiram os eventuais problemas devido ao conteúdo da série.

Nagai foi constantemente criticado por associações de pais e professores da época, que repudiavam com todas as forças, o conteúdo da série. Tanto que quiseram adaptá-lo para anime na TV, mas devido às circunstâncias, a animação acabou não sendo produzida (mas misteriosamente, foi feita uma novela inspirada na série pouco tempo depois, não me perguntem como). Devido às altas críticas, Nagai resolveu encerrá-la e mudou radicalmente a sua abordagem. De um mar de safadeza de dentro de uma escola à uma Guerra em grande escala onde a matança era abordada da sangrenta forma pela qual nós o conhecemos, e dessa forma fez o famoso final de Harenchi Gakuen, que se tornou um símbolo da busca pela liberdade e da rejeição da hipocrisia, onde todos os alunos e professores da escola sem-vergonha, são mortos por organizações de pais e professores e outras forças parentais. Essa foi a forma que Nagai usou para responder à opressão, satirizando a "caça às bruxas" que havia contra ele e a liberdade de expressão que não havia em abundância na época.

Se pararmos para analisar, Nagai ter sido perseguido por APPs foi bom para o seu desempenho, pois isso foi o que tornou o grande crítico que ele viria a se tornar após isso.



Mazinger Z: Embarcando na cabine voadora e explorando novos ares.

Após o final de Harenchi Gakuen, logo na edição seguinte de Jump, Nagai surgia com seu mais novo trabalho (enquanto ardorosamente, fazia mais 4 séries em outras revistas AO MESMO TEMPO), inspirado pelo Astro Boy de Tezuka e pelo Tetsujin-28 de Mitsuteru Yokoyama, Nagai resolve fazer o seu próprio robô, o colosso Mazinger Z. O mangá contava a história de Kouji Kabuto, um garoto que vivia com o seu avô cientista e seu irmão caçula, e um dia, quando acontece um desastre em sua casa, ele descobre o laboratório secreto do avô, que devido ao desastre, vivia seus últimos suspiros, e vê o enorme robô ali, e então o velho pede como último desejo, que Kouji mantenha a justiça no mundo usando o enorme robô, e assim, Kouji recebe de presente do avô, o invencível robô Mazinger Z.

Mazinger foi uma grande inovação na época, mais uma vez, Nagai introduzia novos conceitos ao mundo dos quadrinhos japoneses. Dessa vez, a grande novidade é a forma pela qual o robozão era controlado. O Mazinger Z era o primeiro robô gigante da história dos mangás a ser controlado por dentro de um cockpit em seu interior, ao contrário dos anteriores que eram controlados por controles remotos e afins. Apesar da atmosfera aparentemente familiar da série, Nagai ainda continuava com o seu estilo crítico e rude de escrever roteiros, mantendo ainda os violentos combates e às críticas ao comportamento da sociedade da época, fazendo assim, algo que pouquíssimos autores conseguem hoje em dia: Inserir mensagens críticas direcionadas aos seus leitores camufladas por um mangá de batalha.

Mazinger, pode ser considerado, ao lado de Devilman, um de seus mais influentes e famosos trabalhos. A série gerou uma adaptação animada que teve a supervisão de Nagai (apesar disso, boa parte do conteúdo do mangá original foi amenizada para a produção da série de TV, assim como as adaptações animadas para a TV de suas outras obras), e várias sequências e spin-offs que continuam vivos e fortes até hoje.


Devilman: Quem são os verdadeiros demônios da sociedade?

Ao mesmo tempo que Mazinger Z, Nagai escreveu na eterna concorrente da Shounen Jump, a Magazine, Devilman, que na minha opinião, considero a sua maior obra-prima, e provalvemente, a série em que ele mais se aprofundou na narrativa. Não irei entrar em muitos detalhes neste post, por que já fiz uma análise exclusiva para a série, que pode ser lida aqui.

Devilman, foi o resultado de um projeto anteriormente feito por ele, o mangá "Maou Dante" (Que teve sua adaptação animada feita neste século exibida pelo finado Animax sob o título de "Evil Lord Dante"), que era uma série bem pesada e que reberia altas críticas caso fosse adaptada para uma animação (além de ser inconcebível adaptar algo daquele patamar sombrio na época), e então Nagai reinventou a história, mudando drasticamente vários elementos de Dante, e sem querer acabou aperfeiçoando e melhorando os conceitos anteriormente gerados pelo mesmo, e assim surgindo Devilman, obra marcada pelo uso de lutas extremamente violentas, e um intenso ritmo narrativo, que é a marca registrada de suas séries.

Para mais informações, leiam o post que linkei antes.


Getter Robo: Que Megazord o quê, rapá! O negócio é ser o Getter!

Em 1974, junto de Ken Ishikawa, que se juntara ao Dynamic Pro studios (Estúdio fundado por Go Nagai e seus irmãos) e viria a se tornar um dos melhores amigos de Go Nagai, em plena Shounen Sunday, nasce mais uma revolução no mundo dos robôs gigantes, o grande e agressivo Getter Robo.  A série fala de um cientista chamado Dr.Saotome, que está fazendo uma pesquisa para a construção de um robô revolucionário para a defesa do Mundo, que está para ser tomado por terríveis criaturas vindas do centro da Terra, os Reptilóides e que resolve procurar por três jovens que tenham muita coragem, destreza e bravura para pilotar a mais nova máquina de guerra, o Getter Robo. E então, Saotome escolhe Ryoma, um jovem lutador de artes marciais; Hayato, um delinquente superinteligente; e Musashi, um cara baixinho metido a herói (que no anime é um lutador de Judô) para pilotar o grande Getter Robo e livrar a humanidade dos perigosos Reptilóides.

A abordagem da história em Getter Robo, é feita de forma bem semelhante à de Mazinger Z, mas aqui, temos outra grande inovação por parte de Nagai e Ishikawa. A bola da vez é um robô que pode dividir o seu corpo entre peças automatizadas diferentes que podem se unir, formando assim, inúmeras combinações de formas das mais variadas proporcionando diversas habilidades ao robô, semelhante ao conceito usado nos anos 90 para a adaptação ocidental dos Tokusatsus da franquia de Super Sentai (que aqui na América, são conhecidos como os "Power Rangers").

Se com as séries anteriores, Nagai explorava profundamente seus personagens, com Getter Robo não poderia ser diferente. Nagai e Ishikawa mostram verdadeiras provas de coragem e demonstrações de Bravura pelas quais os personagens são submetidos, principalmente no final do mangá [SPOILERS SOBRE GETTER ROBO] Onde Musashi se Sacrifica heroicamente para possibilitar que seus companheiros tenham chance de prosseguir na batalha final contra os Reptilóides, provando que ele não era só o bobão do time, e que poderia ser um herói de verdade assim como Ryoma e Hayato [FIM DOS SPOILERS SOBRE GETTER ROBO].

Getter também fez um absurdo sucesso no Japão, e gerando um anime que é bem famoso em países Europeus (assim como a maioria das séries televisivas animadas de Nagai), e também deu origem à uma grande gama de spin-offs e à sequência direta "Shin Getter Robo", publicada um ano depois.


Outras obras de Nagai.


- Cutie Honey (1973-1974): O pioneiro das garotas mágicas do mundo dos mangás.




- Violence Jack (1973-1990): Sem dúvidas, o mangá mais doentio de Go Nagai. Introduziu os universos pós-apocalípticos como elemento usado em mangás (influenciando assim, obras posteriores como o clássico da Jump "Hokuto no Ken", por exemplo), e também é facilmente considerado um dos mangás mais lotados de violência da história.



- Dororon Enma-kun (1973-1974): Um clássico que usava elementos de magia, comédia, ação, e muitas sátiras ao mundo machista da época. O mangá fala sobre o sobrinho do chefe do submundo, Enma e seus amigos Yukiko e Kappaeru caçando Youkais pelo Japão para selá-los de volta ao submundo. A série ganhou neste ano uma adaptação animada chamada "Dororon Enma-kun Meera Meera".



Ainda há muito o que explorar sobre Go Nagai, mas isso já está bom para quem ainda não o conhece, conhecer suas grandes obras desse cara que sem dúvida alguma, se tornou o autor mais adepto do politicamente incorreto e da quebra de vários Tabus para o povo Japonês durante os anos 70. Espero que tenham gostado de ler sobre um dos maiores deuses da história dos quadrinhos.


Obrigado pela leitura e por favor comente.

8 comentários:

  1. Olá! Gostei muito do seu post e não conhecia nada sobre o inicio da carreira do Go Nai, na verdade eu acompanho ele bem de longe. Mas senti vontade de me aprofundar ainda mais em seus trabalhos.

    ResponderExcluir
  2. Tenho que tomar vergonha na cara e ler mais coisas desse cara, até agora só li Devilman, que achei sensacional e com certeza doentio, só a mente depravadamente genial do Nagai pra pensar em um negocio daqueles.

    Acho que é praticamente incontestável a importância dele para os mangás, principalmente no universo Jump, que acredito que seria bem mais controlada hoje em dia se não fosse por ele.

    Vou aproveitar essas dicas e ler Violence Jack, parece ser muito bizarro.

    Ótima Review!

    ResponderExcluir
  3. Na verdade, o mangá de Getter Robo é quase que exclusivamente do Ken Ishikawa. Nagai criou o conceito dos robôs que se combinam, mas foi Ishikawa quem escreveu, ilustrou e imortalizou a série como uma das melhores histórias de Super Robôs já criadas. Sua sequência, Getter Robo Go, influenciou diretamente séries como Evangelion e Gurren Lagann.

    Vale a pena conhecer mais sobre Ishikawa, ele vai muito além de um mero imitador do Nagai. No Japão, ele possui uma legião considerável de fãs e alguns afirmam que ele foi capaz se superar o mentor em vários aspectos. Seja verdade ou não, fato é que Ishikawa foi muito ofuscado em sua carreira por tentar imitar o estilo de Nagai. No final dos anos 80, Ishikawa encontrou seu estilo próprio e muita gente considera este o seu ápice como autor. A saga Getter permanece sua obra mais famosa, mas existem muitos títulos que merecem destaque como Maju Sensen, Yakuza Weapon e Kyomu Senshi Miroku.

    ResponderExcluir
  4. Belo post! Não conhecia tanto do Go Nagai, mas só pelo fato de ele ter produzido tantas obras marcantes e conseguir publicar várias simultaneamente (fato que hoje é muito difícil de ser ver) e nas três principais revistas shonen, justifica o status de gênio e grande referência do mundo dos quadrinhos japoneses.

    ResponderExcluir
  5. seu blog é muito bom cara,é um dos melhores(se não o melhor) sobre a cultura dos mangás e sobre o post a unica obra que leio recentemente de go nagai é mazinger Z,mas gostaria muito de ler devilman,mas infelismente acho que nenhu scan brasileiro traduz

    ResponderExcluir
  6. Adooro o nagai, Devilman e o querido Violence jack são esplendidos, eu consigo sentir cada emoção em cada personagem, devilman eu não lembro onde li, mas violence da pra sentir um gostinho aqui ó http://www.goodmanga.net/1648/violence_jack

    ResponderExcluir
  7. Olá, fui ler esse texto em seu blog hoje e gostaria de saber que fontes você usou para elaborá-lo. Estou fazendo meu TCC tendo como objeto de estudo animes e quero fontes seguras para destrinchar um pouco da história dos mangás e animes, e sinto que não poderia deixar de falar nem que fosse um pouco sobre grandes nomes como Shotaro Ishinomori e Go Nagai.

    Se puder me ajudar, eu ficaria muito agradecido. :)

    ResponderExcluir